Conceito Base
A concretização de um filme, programa de Televisão, vídeo ou qualquer outro produto audiovisual requer, sempre, um tratamento da componente sonora ao mais alto nível, pois, apesar de uma imagem valer por mil palavras, a mesma é não só parte integrante do produto final, como contribui, de um modo significativo, para a boa qualidade do mesmo.
Após 1927, ano em que o sonoro substitui, em parte, o mudo no Cinema, o desenvolvimento de equipamentos de captação, tratamento, registo, transmissão e reprodução nunca mais parou, ou seja, de início apenas uma origem no comando das operações, ou seja, o som monofónico, tendo-se passado ao som estereofónico, ao quadrifónico, ao som envolvente (surround), versão 5.1, 7.1, e agora, a despontar no horizonte os sistemas que vão desde o 9.1 ao 13.1, para além do 22.2 do sistema SHV (8K).
Todos estes desenvolvimentos tiveram como único objectivo a reprodução sonora no acto de escuta, idêntico ao existente na fase de captação das imagens a que o mesmo diz respeito.
Som Monofónico
Nos idos anos 20’ do século XX, a sonorização das imagens cinematográficas era não só um desejo de alguns, assim como uma extrema necessidade para outros, como acontecia nos filmes musicais mesmo que a qualidade resultante não correspondesse, minimamente, ao ambiente musical em que a cena era filmada.
De início assumiu-se que a localização da fonte sonora no acto de visionamento de uma dada cena se encontrava na parte central do ecrã onde a imagem se ia formar, pelo que independentemente da sua origem o telespectador assumia a responsabilidade de fazer a necessária associação da fonte sonora ao som reproduzido, inclusive se esse tivesse a sua origem nas costas do mesmo.
No sentido de facilitar a localização da fonte sonora, houve que introduzir, à data, no Cinema e mais tarde na Televisão, elementos que facilitassem a vida ao espectador como, p.ex., num filme de cowboys dar o campo e o contra-campo no instante anterior aos disparos, ficando localizadas as fontes sonoras interventivas.
Verifica-se, deste modo, a necessidade de adaptação da linguagem até então utilizada, devida à introdução deste novo elemento na mensagem a transmitir.
Mas, apesar do grande salto em frente no que respeita à comunicação, que agora deixou de ser só visual e passou a contar, também, com a componente em forma eléctrica sonora (áudio), ou seja, passou a ser audiovisual, o resultado final, face aos avanços entretanto verificados, clamava por novos desafios.
Som Estereofónico
Em determinadas produções o recurso a uma única fonte sonora tornava-se limitadora na reprodução do ambiente mínimo desejável, sem ruído, mas localizado, pelo que o recurso a duas possíveis fontes sonoras, cuja combinação poderia induzir um elevado número das mesmas no espaço contido entre ambas, bastando para tal jogar-se com a diferença dos níveis sonoros existente entre elas.
A esta situação é o que se costuma apelidar de som estereofónico, ou, simplesmente, estereofonia, a qual representou um grande salto em frente quando foi pela primeira vez usada em Rádio, em especial nas radionovelas em que a localização sonora dos personagens e dos ruídos de cena reproduzidos trouxeram a este meio um valor acrescentado incalculável.
No Cinema o fenómeno foi idêntico, com cenas de comboios a passarem do lado direito para o esquerdo, ou então o ricochete das balas nos filmes de cowboys, como acontece no Makenas Gold, para nós marcante enquanto experiência.
O sistema baseia-se, fundamentalmente, em dois canais sonoros, podendo estes alimentar um elevado número de altifalantes, distribuídos de modo a caracterizar bem as cenas reproduzidas no ecrã, sem que haja, contudo, a noção de envolvimento, dito total, dado que o espectador se encontra para cá do plano sonoro reproduzido, tendo-se apenas a noção de esquerda/direita e não a de profundidade como à frente/atrás.
Há a considerar dois tipos básicos de som estereofónico, o dito natural, verdadeiro ou directo, o qual recorre, na captação, a dois microfones direccionais justapostos em cruz, configuração X-Y, captando o do lado direito a fonte sonora esquerda e vice-versa, ou, em alternativa o artificial ou pan-pot (panoramic-potentiometer) em que o ambiente sonoro de fontes distribuídas num dado espaço é conseguido graças à actuação de um potenciómetro que permite o envio para um dado canal o som mais baixo e para o outro com um a potência superior, criando, ao nível do ouvinte a sensação de que o som mais intenso indica a direcção correcta da origem do mesmo.
No que respeita à captação há ainda outros métodos de tratamento, das quais destacamos a técnica M/S (Mid/Side stereophony) na qual se recorre a um microfone bidireccional, e a um segundo microfone colocado a 900, relativamente à fonte sonora, sendo os canais estéreo obtidos a partir da soma de dois-a-dois, ou seja, o canal esquerdo resulta da mistura do Mid+Side e o canal direito da mistura de Mid-Side.
Caso se registe a informação dos dois captadores, mais fácil é a manipulação destes sinais na fase de Pós-Produção áudio, obtendo-se dois canais mais de acordo com o produto final pretendido, como é o caso de uma produção em Alta Definição em que o elemento sonoro é uma preciosa ajuda à imagem que suporta.
Uma outra técnica empregue dá pela designação de Near-Coincidente, a qual não é mais do que a mistura das duas anteriores, ou seja, colocam-se os dois microfones direccionais (cardióides) defronte do espaço sonoro a captar, fazendo estes um ângulo de 1100, entre si, e um afastamento das cápsulas transdutoras de 17cm, correspondendo este à distância média entre as orelhas de um ouvinte tipo.
A juntar às técnicas anteriores há ainda a considerar a chamada técnica Pseudo-Estéreo, a qual não é mais do que uma tentativa de proporcionar a um som captado em mono a possibilidade deste aparecer aos ouvidos de um ouvinte menos selectivo como sendo um som estereofónico.
Por estranho que possa parecer, as primeiras experiências sobre som estereofónico tiveram lugar em Paris, no ano de 1881, por ocasião da Paris World Exibition, em que os ouvintes foram colocados numa suite de um hotel, tendo-se recorrido a telefones individuais, dois para cada ouvinte, proporcionando a estes a possibilidade de seguirem à distância e em directo o que estava a acontecer na Ópera de Paris.
A chegada da estereofonia aos discos de áudio (vinil) só se verificou em 1958, contudo, a empresa britânica EMI fez o registo de patente em 1933, tendo este sido usado naquele suporte até ao aparecimento dos discos compactos (CD’s).
O primeiro filme sonoro The Jazz Singer, realizado em 1927, foi concretizado em termos sonoros com o registo monofónico.
A chegada da Televisão estereofónica a Portugal deu-se apenas em 1993, sendo o sistema escolhido o NICAM (Near Instantaneous Companded Audio Multiplex).
Dolby Digital
Em termos de apresentação pode considerar-se que o Dolby Digital, formalmente apelidado de AC-3 (Audio Codec-3), é uma técnica de codificação digital com a virtualidade de reduzir o volume de dados gerados na digitalização de um sinal áudio, com o objectivo final de se obter um som de muito alta qualidade no acto de escuta.
Apesar da qualidade superior a que a estereofonia nos transporta, a exigência cada vez maior de um som mais real, a acompanhar a subida constante da qualidade da imagem, levou a Dolby Laboratories a desenvolver um sistema, ou família de sistemas, o Surround Sound (Som Envolvente), no qual o som, para além da componente sonora dos diálogos transporta, também, a informação do estado do meio sonoro envolvente, levando o espectador a participar num mundo completamente imersivo em que o som é tratado como elemento principal na experiência, ao ponto de o conceito de ver e ouvir o que se passa num ecrã seja profundamente alterado.
Como vimos anteriormente, o estéreo convencional recorre a dois altifalantes para a criação de som dimensional no espaço em frente à sua posição.
Contrariamente, o som Surround recorre a um grupo de altifalantes colocados estrategicamente em torno do local onde se vai sentar, de modo a criar-lhe um ambiente sonoro multidimensional, próprio para o visionamento de filmes, jogos de futebol, espectáculos musicais e tudo o que possa imaginar, encontrando-se o espectador no centro das operações.
Dolby Surround Sound 5.1
De acordo com a marca, o codec áudio Dolby® Digital 5.1 é um standard de som envolvente (surround sound) concebido para o fornecimento de seis canais discretos de áudio à maioria dos meios audiovisuais de entretenimento, nomeadamente aos sistemas leitores Blu-Ray, canais de Televisão Digital Terrestre, Cabo e Satélite, Cinema, Computadores, Internet e mesmo aos sistemas de Videojogos.
Entenda-se por seis canais discretos o facto de cada um destes canais apresentar um som próprio, sem que haja, portanto, qualquer dependência entre os mesmos.
A designação 5.1 tem como objectivo informar que o sistema carece de 5 altifalantes que apresentam uma resposta em toda a gama audível, com excepção dos graves, para os quais foi reservado um altifalante adiciona, um sub-woofer (.1) para a reprodução dos sons de frequência mais baixa, ou seja, os sons graves, os tais que fazem com que a nossa estrutura física entre numa perfeita revolução sempre que estes estão presentes.
A disposição dos cinco altifalantes segue a filosofia usada nas salas de Cinema, ou seja, canal esquerdo, canal central e canal direito, junto ao ecrã do televisor, estando reservados dois altifalantes para o som envolvente, precisamente na parte traseira do ponto de escuta, sendo um colocado no lado direito e outro no lado esquerdo.
A resposta do sistema à gama das frequências que estão compreendidas no chamado espectro das audiofrequências, ou seja, as frequências que o ser humano médio consegue ouvir, as quais vão, de um modo grosseiro, dos 20Hz aos 20KHz, sendo o altifalante dos graves, o subwofer o responsável pelo tratamento da gama de frequências dos 3 aos 120Hz, sendo coberta a gama acima desta pelos restantes altifalantes.
O facto de o sistema conseguir reproduzir infra-sons, compreendidos entre zero e os 20Hz, permite mexer com a chamada estrutura física do meio ambiente, ou seja, cadeiras, sofás, chão e paredes, correspondendo, deste modo, a uma realidade mais efectiva, dado que no mundo real tal fenómeno se verifica.
Os diálogos são reproduzidos, normalmente, pelo altifalante central, excepção feita aos enquadramentos que justifiquem a sua colocação à direita ou à esquerda, função do elemento que fala e da sua localização no ecrã.
A música e os efeitos sonoros, como tiros, ruídos ou elementos fora do enquadramento são reproduzidos pelos altifalantes laterais, estando reservado para os traseiros o chamado som envolvente (Surround), ou seja, todos os sons que pertencem a uma dada cena mas que não “cabem” nos altifalantes anteriores, incluindo-se neles ruídos, assim como elementos fora de cena numa posição anterior à cabeça do telespectador.
Dolby Surround Sound 7.1
Com a entrada fulgurante das imagens 3D tanto no mundo do audiovisual, a Dolby Laboratories desenvolveu um novo formato de reprodução áudio, o Dolby® Surround 7.1, para já apenas no Cinema, prevendo-se a curto prazo contemplar também a Televisão, o qual proporciona a quem vê as imagens uma maior profundidade e um realismo mais efectivo.
Nos EUA com o arranque da Televisão Digital e da Alta Definição, os telespectadores passaram a dispor, também, de uma qualidade superior na componente sonora, graças ao uso do Dolby Surround 5.1, contudo, o objectivo é dar-se o salto para o nível seguinte, através da adição de dois novos canais discretos de som envolvente, obtendo-se, assim, quatro zonas distintas de Surround Sound, localizadas na parte traseira e lateral da instalação.
Com este procedimento, torna-se muito mais fácil a localização das várias fontes sonoras envolvidas na captação de uma dada cena, graças ao aumento significativo da dimensão espacial sonora, o que dá ao Realizador, ao Editor de Áudio na Pós-Produção, assim como ao Sound Designer um universo sonoro mais rico e muito mais próximo da realidade, alargando o espaço menos abrangente de visionamento a que os sistemas anteriores obrigavam.
Áudio 3D: A Quarta Dimensão
A memória que nos conduz ao registo e reprodução sonora diz-nos que houve sempre a ideia de disponibilizar ao cliente final, leia-se, ouvinte, espectador, telespectador, o máximo que a tecnologia no período temporal considerado nos pode oferecer.
Tanto a Rádio, como o Cinema e ainda a Televisão durante muitos anos apenas se apresentaram com a característica monofónica, ou seja, todo o mundo envolvente sonoro da cena ou situação apresentada era reduzida a um único ponto sonoro de onde emanavam os diálogos, os efeitos sonoros, o comentário e o trecho musical.
A partir do momento em que foi entendido pelos técnicos, assim como pelos criativos, a importância real da componente sonora em qualquer tipo de trabalho audiovisual o som e o sinal eléctrico dele resultante, ou seja, o sinal áudio, não mais deixou de acompanhar os saltos tecnológicos que a imagem obrigou, ou seja, numa primeira fase a estereofonia, depois a quadrifonia, a que se seguiram os vários formatos Dolby Surround, nomeadamente o 5.1 (Cinema e Televisão) e o 7.1, aliás, como vimos anteriormente.
Contudo, para o Cinema e Televisão, está em vias de ser aprovado, internacionalmente, uma nova norma que permite ir do chamado 9.1 ao 13.1, graças à proposta feita pela empresa AURO 3D, respondendo esta, de um modo muito positivo, às necessidades que o advento do Cinema e da Televisão 3D obriga, ou seja, ao acompanhamento das imagens cada vez mais imersivas, pois sem a ajuda sonora tal não é possível obter, digamos, a 100%.
De acordo com o estudo levado a cabo pela Televisão Pública Japonesa, a NHK, prevê, para 2015, o arranque de emissões experimentais em SHV (Super High Vision – 8K) no Japão, o qual acarreta o recurso ao chamado 22.2, ou seja, 22 canais de áudio, gama completa, e dois subwoofers para a reprodução da faixa inferior do espectro áudio, sendo o mesmo considerado um sistema quase no limite da percepção sonora humana.
Em termos de comentário verifica-se que, finalmente, em Televisão e Vídeo, o som não é mais o “parente pobre” de qualquer Obra audiovisual, sendo, bem pelo contrário e cada vez mais, um parceiro fundamental das imagens a que diz respeito.