A Poesia e o Folclore na Televisão
21/03/2024
Texto: Carlos Alberto Henriques
A Amizade Com Amália Rodrigues
Entre Pedro Homem de Mello e Amália Rodrigues havia uma amizade que ia para além da relação entre o poeta dos seus fados e a cantora dos seus poemas, pois entre vários títulos onde se inclui os estrondoso sucesso de “Povo Que Lavas no Rio” há, ainda a destacar: “O Rapaz da Camisola Verde”, “Havemos de Ir a Viana”, “Fria Claridade” e “Cuidei Que Tinha Morrido”, os quais constituíram um enorme sucesso, tanto nacional como internacional, nas suas múltiplas deslocações por todo o mundo.
Ambos se procuravam sem se procurarem, sendo de Amália as palavras:
“ O Alain Oulman, o responsável pela adaptação para fados dos poemas que canto, agarrou-se também a grandes poetas, um deles foi o Pedro Homem de Mello, que era mesmo muito grande. Não é daqueles mais eruditos, mas é daqueles com o coração maior. É uma pessoa de uma família muito boa, uma pessoa extraordinária”
Foi esse “coração maior” que tocou a sensibilidade de Amália, que de forma intuitiva adivinhou a sua tragédia em “O Rapaz da Camisola Verde”:
“O Pedro Homem de Mello era um homem extraordinário. Tinha uma maneira de ser português de que eu gostava. Tinha um amor profundo por Portugal. Gostava da música da sua terra, era um homem à minha maneira. E um grande poeta. Quando acertava era em cheio, era um poeta como o García Lorca. Aquele “Grande, grande, era a cidade/E ninguém me conhecia” é que me deu no goto. Por isso é que o quis cantar. É esta minha tendência, quanto mais triste melhor. Tudo quanto canto dele é bonito, nem sei de qual gosto mais. Gosto de todos. Aquele grito “A Minha terra é Viana” é um grito de amor à terra, ao Minho. São tudo coisas vividas, o Fandangueiro, o Rapaz da Camisola Verde, Havemos de Ir a Viana, Gondarém, têm até o sal e a pimenta dessa vivência”.
Casino da Póvoa de Varzim (1973)-(Cortesia: Museu Nacional do Teatro e da Dança)
No dia do funeral de Pedro Homem de Mello, Amália Rodrigues fez questão de estar presente na Igreja do Carvalhido para acompanhar o corpo até ao cemitério de Afife, onde está sepultado em campa rasa por seu desejo, expressou o seu pesar pela perda de um Amigo, com as seguintes palavras:
“Fui eu quem mais cantou Homem de Mello, desde rapariguinha. Por isso, a sua morte significa algo de muito doloroso para mim. Desde muito novo que o poeta me marcou. Ele gostava muito de tudo o que fosse português e fazia versos com o coração.”
Amália a Cantar Pedro Homem de Mello (Cortesia: RTP Memória)
Povo Que Lavas No Rio
Povo que lavas no rio
Que talhas com o teu machado
As tábuas do meu caixão
Povo que lavas no rio
Que talhas com o teu machado
As tábuas do meu caixão
Pode haver quem te defenda
Quem compre o teu chão sagrado
Mas a tua vida não
Fui ter à mesa redonda
Beber em malga que esconda
O beijo de mão em mão
Fui ter à mesa redonda
Beber em malga que esconda
O beijo de mão em mão
Era o vinho que me deste
Água pura, fruto agreste
Mas a tua vida não
Aromas de urze e de lama
Dormi com eles na cama
Tive a mesma condição
Aromas de urze e de lama
Dormi com eles na cama
Tive a mesma condição
Povo, povo, eu te pertenço
Deste-me alturas de incenso
Mas a tua vida não
Povo que lavas no rio
Que talhas com o teu machado
As tábuas do meu caixão
Povo que lavas no rio
Que talhas com o teu machado
As tábuas do meu caixão
Pode haver quem te defenda
Quem compre o teu chão sagrado
Mas a tua vida não
Sobre Amália Rodrigues, seguem as palavras, em 1967, de Pedro Homem de Mello:
“Já lá vão alguns anos, encontrava-me eu na altura de passagem em Lisboa, quando fui uma noite depois do teatro, ao Café Luso. A casa estava à cunha, o que não admira, pois dali a instantes entrava a Amália… E começou a cantar.
Qual não foi o meu espanto ao ouvir na sua voz palavras de uma poesia minha que principiava assim:
No meio da claridade
Daquele tão triste dia
Grande, grande era a cidade
E ninguém me conhecia
Eu era então muito mais novo do que sou agora, mas como escritor já muito combatido. De resto, feliz ou infelizmente, continuo a sê-lo. Ora, o que eu senti naquele momento, foi uma sensação de vitória… de vitória decisiva, a maior que eu pudesse ambicionar, pois realizei, naquele instante, que a minha poesia, na voz extraordinária da Amália, tinha subido até ao Povo.
E essa impressão repetiu-se depois, mais tarde, quando a Amália começou a cantar o “Povo que lavas no rio”, e, ultimamente, o “Fandangueiro.
Obrigado, portanto, Amália, obrigadíssimo”.
Amália Rodrigues e Pedro Homem de Mello no Grémio Literário (1973)
Artistas que cantaram Pedro Homem de Mello
A referência aos vários Artistas da canção nacional que cantaram Pedro Homem de Mello é deveras longa, indo a nossa atenção apenas para aqueles cujo conhecimento popular é imediato e bastante sonoro, ou seja:
Relativamente aos poemas por estes cantados, a lista ainda é maior, razão pela qual nos limitamos a fazer referência aos mais marcantes: